O canal de notícias Bloomberg, publicou ontem aqueles que são os novos “7 pecados mortais” - um ofício do Vaticano dá conta da intenção da igreja católica em modernizar-se actualizando os 7 conhecidos comportamentos fatais tornados públicos no séc. VI. Entre alguns destes pecados estão, tal como a instituição católica os definiu, o controlo da natalidade e a investigação em células estaminais.
Em relação ao primeiro, não nos restam dúvidas da referência explícita que faz à interrupção voluntária da gravidez. O pontificado insiste permanentemente naquilo que é a intolerância e a irresponsabilidade perante um grave problema de saúde pública. Agora que caminhamos para a resolução desta situação em Portugal, é nossa tarefa perceber o que está a acontecer nos restantes países do mundo, sobretudo nos países mais pobres que têm leis restritivas em relação ao aborto. A situação económica que existe em países da África sub-sahariana ou na América Central e do Sul afecta em particular as mulheres - não só porque são as primeiras vítimas da pobreza e da exclusão social, mas também porque não têm acesso facilitado aos meios de controlo da sua reprodução ou a centros de saúde sexual reprodutiva. Nestes locais, onde o direito a escolher o seu futuro e a decidir sobre a sua família e o seu corpo estão “embargados” por dificuldades económicas, a restrição no acesso à IVG só vem acentuar essas mesmas dificuldades.
A igreja católica (que neste mesmo ofício elege a pobreza como pecado mortal) contradiz-se. Porque ignora que a incapacidade das mulheres decidirem a sua vida reprodutiva reproduz essa mesma pobreza. Porque ignora que a inacessibilidade a uma saúde sexual e reprodutiva consistente as torna vulneráveis à exploração, à doença e à submissão. Mas acima de tudo, o patriarcado católico ignora o relatório publicado pela ONU há cerca de 1 ano, que elege a desigualdade de género como o factor cimeiro de perpetuação da pobreza - não nos espanta, a dificuldade no acesso a uma IVG medicamente assistida ainda hoje é responsável por 60000 mortes anuais, em todo o Mundo.
Mas a formulação do pecado adoptada pela Igreja é curiosa: “birth control” - deixa-nos margens alargadas à imaginação para percebermos o óbvio: é pecado usar contraceptivos! No séc. XXI, 1400 anos depois da edição da 1ª versão dos pecados mortais, o catolicismo institucional continua séculos atrás da realidade social. Prefere colocar a cabeça na areia e fingir que no Mundo não se fazem abortos ilegais, não se tem relações sexuais antes do casamento, a SIDA só ataca os pecadores sem salvação e que mais vale morrer de cancro e sem pecado, do que permitir a investigação em células estaminais para que no futuro o possamos vencer.
Bruno Maia, Médicos Pela Escolha