Artigo de Jornal de noticias -
Paula Lagarto e Sandra Moutinho, Lusa
As infecções e a perfuração de órgãos associadas ao aborto clandestino diminuíram em mais de metade desde que a lei da Interrupção Voluntária da Gravidez entrou em vigor, há um ano, revelou o Director Geral da Saúde.
Em entrevista à Agência Lusa, a propósito do primeiro ano da aplicação da lei que permite a IVG até às dez semanas, cuja regulamentação entrou em vigor a 15 de Julho de 2007, Francisco George considerou que estes dados revelam que “a lei é boa e protege as mulheres”.
No primeiro semestre de 2007, registam-se 23 septicemias (infecções muito graves) e 11 perfurações de órgãos associadas à prática de aborto clandestino, revelou o Director Geral da Saúde.
Já com a lei em vigor, na segunda metade do ano, ocorreram doze septicemias e uma perfuração, uma redução que Francisco George atribui à lei e que demonstra que o aborto clandestino é hoje “residual” em Portugal.
Desde 15 de Julho, a Direcção-Geral da Saúde registou apenas dois casos de prática de aborto clandestino, um dos quais está a ser investigado pelo Ministério público.
A rede oficial integra 38 hospitais públicos, três unidades privadas e três centros de saúde. Nestas instituições realizaram-se, no último ano, 14.247 IVG.
A esmagadora maioria das interrupções foi feita por método medicamentoso.
Para Francisco George, esta opção deve-se ao facto de ser um método “menos traumatizante e muito eficaz, se utilizado até à nona semana”, sendo contudo “mais lento”.
Mas existem outras diferenças entre estes métodos, já que o medicamentoso é mais barato: 341 euros, contra os 444 euros que custa a interrupção cirúrgica.
A opção dos serviços públicos pela interrupção medicamentosa contrasta com a escolha dos privados.
Segundo Francisco George, “há uma grande, enorme diferença entre o que se verifica nos sectores público e privado da rede”.
Perto de 100 por cento dos serviços públicos utiliza o método medicamentoso, enquanto mais de 90 por cento dos privado opta pelo cirúrgico.
“Provavelmente há aqui uma razão cultural, já que as mulheres portuguesas, no tempo da clandestinidade, entravam e meia hora depois, saíam com a intervenção realizada”, disse.
Francisco George reconheceu que a objecção de consciência foi uma questão que preocupou as autoridades durante a preparação da aplicação da lei.
Contudo, um ano depois, garante que este assunto não inviabilizou a prática da IVG, tendo a objecção de consciência dos profissionais de saúde sido “inteiramente respeitada”.
A resposta dos serviços assentou no funcionamento “em rede” da rede oficial que, na impossibilidade de realizar a IVG nos hospitais procurados pelas mulheres, as encaminhou para outros hospitais públicos ou privados.
“Das quase 15 mil interrupções que foram feitas ao longo deste ano, são poucas mais de 2.000 as realizadas nos serviços privados, apoiados pelos serviços públicos”, disse.
Francisco George salienta que não se registaram queixas de utentes e que é notória a confiança das mulheres, traduzida no aumento da procura dos serviços da rede oficial que se tem registado.
“Comparando o primeiro semestre com o segundo [do primeiro ano da aplicação da lei] reparamos num aumento da procura nos serviços públicos”, o qual “se traduz também numa diminuição das interrupções praticadas em ambiente clandestino e ainda em menos idas ao estrangeiro”, frisou.
Outro dado salientado por Francisco George refere-se às desistências, com 700 mulheres a optarem por prosseguir com a gravidez após “a consulta prévia de aconselhamento sobre os apoios que o estado dá à gravidez”.